E porque estas andanças dão para ir acumulando atrasos, era já noite muito feita quando arribámos a uma exploração vitivinícola, a Herdade do Meio – para se ficar boquiaberto. É que esta é uma história fabulosa – de fábula, precisamente. Espera-nos o homem que meteu pés ao caminho – foi nascido lá para as bandas de Penamacor, e casou com alentejana – e mãos à obra. Ora ouçam, se a memória não atraiçoa. De seu nome João Pombo, era homem do turismo, e quem o conhece atesta que levou o nome de Portugal por esses paralelos e meridianos fora. Às tantas, força dos tempos – será também coisa do El Niño – foi ele levado, seja isso o que for, a ceder num desses processos de concentração que leva os mais pequenos mas nem por isso menos apetitosos – veja-se os jaquinzinhos – a serem abocanhados pelos maiores e mais poderosos. Então, Pombo, vendeu, dizem que assisadamente. Só que, ficou sem poder voltar ao seu ramo natural de actividade, por contrato assinado nesse sentido. Que fazer com a “pipa” de massa arrecadada? O lado alentejano do casamento a encarar a compra da tal casinha que tantos tem levado ao Sul. Buscando lá foi parar a esta Herdade do Meio, guarnecida de vinhas que, a um homem de negócios como ele, para mais com formação académica na área das gestões e economias, logo se impuseram como a saída para o capital que não deve ter mais que fazer do que reproduzir-se. Meteu mãos e dinheiro – próprio e de crédito – à obra, a aprontou-se a ter vinho no mercado logo daí a uns meses, quando fosse tempo de vindima. Mas, inexperiente na área, não sabia nem supunha que havia uma crise do vinho. Ou seja, que os néctares do Alentejo são obra, são apreciados, mas no mercado há vinho a mais, e muitas adegas ingurgitam de produções antigas. Morrer na praia, ele? Garante que não, ali ao frio e silêncio dos campos neste Dezembro calmo. Bateu-se por mercado, imaginou saídas, recorreu a amigos, e por fim lá veio generosa encomenda de garrafas. Ora, ele não tinha das tais reservas paradas, o que significa capital não reprodutivo, e pelo contrário até foi obrigado a subir a parada, ou seja, comprar mais uvas a produtores alheios, para cumprir a prometido. Daí para cá tem sido um virote. O que lhe está atravessado na garganta é que a parte edificada da Herdade do Meio, esgotou a cota que lhe foi fixada no Plano Director Municipal que vigora no concelho de Portel. Construiu adega, instalações, mas o tal sonho de casinha ali à beira do negócio consumiu-se no malvado PDM. Lamento do empresário, espadeirando contra tudo e todos que são empecilho: não pode crescer tanto quanto podia e queria, para bem municipal, regional e do país. Ataca, ataca. Ali, connosco, o presidente da câmara apara-lhe os desejos, reivindicações, tanto mais que o tal plano director vem de tempos em que ninguém imaginava este surto de crescimento: é a barragem, são os vinhos, é o azeite. E o turismo, ouviram? Já investiu milhões, prepara-se para manter a semeadura, assim haja condições. Declara, alto e bom som, a deliberação de resistência, a este e outros empecilhos, a brigas com o IFADAP ou às alegadas picardias da Inspecção do Trabalho. Há mais milhões, presume-se, o negócio vinga. E já ele tem na manga um projecto de maternidade de porcos alentejanos, essa quintessência alentejana que avassalou a gastronomia portuguesa. É futuro que outros empresários também já exibem. Foi jantar, então, recheado de declarações ribombantes: o marreco matado expressamente para este convívio esteve à altura, os vinhos da casa sobrevoaram (há um reserva que não é para todos os gostos, mas de gabarito). E ouviu-se o tal coral alentejano, dizimado pelos tais afazeres natalícios, como já assinalei. E o presidente da Câmara, lá se fez primeira voz, ponte entre dois estilos de cantar as modas. |
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