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| Garrafas e latas vazias, sacos de plástico e tantos outros desperdícios desfiguram quase sempre as paisagens portuguesas, por incúria e desmazelo de quem as frequenta.
Mas em Ponte de Lima, o lixo nos jardins tornou-se uma forma de arte, servindo também de alerta para a necessidade de evitar a produção de resíduos e de encontrar formas de os reaproveitar, num país em que cada cidadão produz em média 450 quilos de lixo por ano.
Na terceira edição do Festival de Jardins, uma iniciativa surgida em 2005 como forma de valorizar as margens do rio Lima e atrair mais visitantes àquela vila minhota, o lixo reina em onze espaços concebidos por artistas plásticos, arquitectos paisagistas, designers e engenheiros agrícolas.
Inicia-se o passeio no “Jardim das Avestruzes”, onde várias esculturas destas aves, escondidas de cabeça na areia, exemplificam a atitude de muitos face à acumulação de desperdícios e embalagens.
Quem quiser pode experimentar na prática esta postura: está disponível um buraco para ajudar os visitantes a reflectir.
No “Sonho meu, Sonho Meu”, jardim que transitou do ano passado por ter sido o mais votado pelos visitantes, apela-se às memórias da infância com baloiços azuis pendurados nas árvores.
Prossegue-se para um “Jardim de (Com)Trastes” que mostra novas utilizações para materiais que deixaram de ter utilidade, incluindo bancos de pneus e uma original árvore onde o lugar das folhas foi tomado por espelhos.
No “Jardim Reciclado”, estruturas em rede metálica formam “ecopontos” preenchidos com plástico, cartão e vidro.
A reciclagem, neste caso de paletes, serviu também de inspiração ao espaço denominado “Hiperbolização”.
Neste local, estas peças tornaram-se decorativas e ganharam usos alternativos, servindo de bancos, revestimento de piso e mesmo estacionamento de bicicletas, num jardim perfumado por ervas aromáticas.
A história do “Homem que plantava árvores” conta a nova vida de garrafas comuns de plástico que se transformaram num curioso cacto e que são também usadas como vasos onde se semeiam plantas.
O ciclo do papel é demonstrado no “Jardim de Cartão” onde os artistas evidenciaram as possibilidades deste material, usando rolos de cartão para construir bancos de jardim.
Na “Metamorfose” descobre-se como as lixeiras se podem transformar em espaços verdes. À entrada, vêem-se resíduos acumulados, à saída apenas lombas cobertas de vegetação.
A arte de evitar o lixo serviu de inspiração para o jardim seguinte. Aqui, a relva foi substituída por arbustos, evitando o uso de pesticidas e adubos e poupando nos gastos com a manutenção. Máquinas de cortar relva e ferramentas de jardinagem abandonadas reforçam a mensagem.
“Era uma casa” mostra os objectos esquecidos que um dia foram úteis. Televisores, cadeiras, utensílios de cozinha, banheiras, tábuas de engomar e brinquedos surgem enquanto se transpõem as portas colocadas ao longo de um passadiço metálico.
“As plantas reciclam” exemplifica como se pode despoluir usando a vegetação. O girassol pode ser usado para absorver o chumbo em solos anteriormente ocupados por indústrias pesadas. O tabaco consegue armazenar o cádmio. A mostarda absorve gasóleo. Os crisântemos purificam os solventes provenientes de colas e tintas. O falso papiro tem capacidade para reter as toxinas do ar interior.
O percurso termina numa interessante instalação (“Como o lixo entra no jardim”) criada por estudantes austríacos que reconverteram caixotes do lixo usados nos 27 países comunitários em coloridas floreiras.
“Os jardins começam a ser um emblema muito forte” para a promoção turística da vila, a par do património e do vinho verde, salientou o presidente da câmara, Daniel Campelo.
Engenheiro agrónomo de formação, o autarca visitou um dia um festival francês em Chaumont-sur-Loire e decidiu importar a ideia para a vila que já conquistou o título de “mais florida de Portugal”.
“Depois de ter visto esse festival que movimentava centenas de pessoas e ver como o espaço público era tratado de maneira diferente noutros locais, resolvi fazer essa aposta em Ponte de Lima, com o apoio do arquitecto Caldeira Cabral”, contou o responsável do município.
Para Daniel Campelo, “os jardins aumentam a justificação de uma visita a Ponte de Lima”, além de proporcionaram “mais alegria e bem-estar aos residentes”.
Ao mesmo tempo, “vai-se criando uma cultura interna. As pessoas vão ganhando orgulho em competir com os seus jardins, reduz-se a importância dos muros e valorizam-se as sebes vivas”.
A verdade é que a iniciativa tem ganho uma importância crescente, quer em termos de visitantes, quer de participantes, que aumentaram de 18, na passada edição, para 30 este ano.
Embora sejam considerados efémeros, os espaços que se apresentam a concurso têm sido reaproveitados noutros locais, dentro e fora do país.
“Embelezamos os nossos espaços e fazemos a promoção dos jardins lá fora”, adiantou a responsável do serviço de espaços verdes da câmara, Eva Barbosa.
Igualmente vantajoso é o facto de o evento praticamente não pesar no orçamento da autarquia, graças às receitas das bilheteiras, do “merchandising” associado e ao apoio dos patrocinadores.
O público pode visitar o Festival e eleger o seu jardim preferido até ao dia 30 de Outubro.
Para o ano, está já escolhido novo tema. Artistas e profissionais vão ter de imaginar como aproveitar as energias alternativas, propondo jardins mais ecológicos. |
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