05 março, 2007

SABORES PASSEADOS, (7)
- ideias ralas no Congresso das Açordas

CONGRESSO DAS AÇORDAS - Portel, Março de 2007
Orfandade de referências e mão
de obra barata

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Mas que virtudes são essas as do alho? do alho da açorda. mas também do alho que, disposto em cruz e desenhado a azeite era reza para todas as maleitas. E se havia clínicos comentários jocosos acerca do obscurantismo das gentes, havia também opiniões médicas que não desfeiteavam de supetão essas outras formas de tratar doenças do corpo ou sofrimentos da alma. Até porque muitas vezes as “mulheres de virtude”- como se dizia em algumas partes de Alentejo - tinham o respeito de haverem sido as parteiras de gerações inteiras de conterrâneos.

Voltando às açordas, tenho para mim ser esforço meritório - mas de resultados sempre duvidosos, porque sempre inacabada - essa tarefa de determinar o que se ajuntava ao pão e à agua, ao alho e ao azeite para fazer as sopas. Porque...quase tudo o que de comestível houvesse e fosse possível agenciar...dava para fazer açorda. Ainda há uns dias, quando o Passeio de Jornalistas percorreu rotas de Alqueva e Portel, as refeições converteram-se em mostruário de misturas e combinações, de produtos e temperos, com que se pode tecer uma açorda.

Acrescentem-lhe mais alguns ingredientes que permitam que a insatisfação e a falta de horizontes de parcelas de camadas mais jovens de portelenses, se afirmem como orgulho de modos de vida e de sentimentos de pertença a uma comunidade que tão inventivas formas de subsistência foi criando para fazer face a todos os tipos de fomes. Para que os momentos de cobiça turística se não convertam em desapossamento, marginalização e quase expulsão.

Numa terra que é vossa, não podem ser desperdiçados quaisquer laivos de imaginação, envolvimento e iniciativa. E se é fundamental que os mais novos aprendam a manejar as ferramentas que as info-tecnologias vieram disponibilizar, não há grande futuro para comunidades que, não conhecendo as suas raízes nem valorizando o acervo cultural que os banha (ou devia banhar!), acabam órfãos de referências e convertidos em mão de obra barata e precária.

Até porque Espanha está aqui ao lado. Não sei se é bom ou mau... mas é uma inevitabilidade geográfica. Também... se não fossem os espanhóis nós não podíamos beber vinho a copo nos restaurantes porque a Fiscalização não deixava. Salvaram-nos os castelhanos com a tal ressalva à legislação comunitária para defesa da sua sangria. E nós lá pudemos voltar ao vinho a copo... às vezes, do lado de lá... também vem bom tempo.


Continua

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